neuropsicologia, psicologia

A importância do tempo livre para brincar na Infância

Brincar: importante forma de comunicação infantil. É por meio deste ato que a criança aprende a reproduzir o seu cotidiano, o que possibilita seu processo de aprendizagem, pois facilita a construção de sua reflexão, autonomia e criatividade. O brincar apresenta papel fundamental para o desenvolvimento integral do ser humano nos aspectos físico, social, cultural, afetivo, emocional e cognitivo.

É necessário conscientizar pais, educadores e sociedade em geral sobre a importância da criança vivenciar a ludicidade: o brincar faz parte de uma aprendizagem prazerosa sobre estabelecer e seguir regras constituídas por si e pelo grupo, contribuindo na integração do indivíduo no mundo que o cerca. Deste modo, à criança estará resolvendo conflitos e hipóteses de conhecimento e, ao mesmo tempo, desenvolvendo a capacidade de compreender pontos de vista diferentes, de fazer-se entender e de demonstrar sua opinião em relação aos outros.

Perceber e incentivar a capacidade criadora das crianças é de grande importância, pois esta se constitui numa das formas de relacionamento e recriação do mundo, na perspectiva da lógica infantil. É por meio das brincadeiras e dos jogos que ela consegue extravasar suas tristezas e alegrias, angústias, entusiasmos, passividades e agressividades, envolvendo-se no jogo e nas partilhas, o que proporciona um auto-conhecimento assim como o conhecimento do outro. Além da interação que os jogos proporcionam, são fundamentais para o desenvolvimento dos aspectos cognitivos: memória, linguagem, atenção, concentração, percepção, além do desenvolvimento motor, psíquico e emocional.

Captura de Tela 2016-06-15 às 16.03.43.png

 

Vemos que a ludicidade é uma necessidade do ser humano em qualquer idade, mas principalmente na infância, na qual ela deve ser vivenciada, não apenas como diversão, mas com objetivo de desenvolver as potencialidades da criança. Em pesquisa (apresentada no vídeo de Michael Moore*) realizada na Finlândia, país cujo sistema educacional consta entre os melhores do ranking mundial, observou-se que o aumento do tempo livre destinado a brincadeiras foi um dos principais fatores para a melhora do desempenho escolar infantil. Uma carga horária educacional de muitas horas, além de causar uma baixa na produtividade escolar, ainda pode desmotivar os alunos para o ensino.

Hoje em dia, há uma sobrecarga de tarefas e responsabilidades infantis: além da escola, estão presentes os cursos de línguas, esportes, artes, música, gastronomia… entre outros de uma lista infinita. Embora favoreçam o desenvolvimento das crianças, quando em excesso, provocam a exaustão e retiram o tempo destinado a principal tarefa infantil… o brincar! A preservação do espaço para jogos e atividades lúdicas no cotidiano da criança é fator imprescindível, tornando mais fácil e dinâmico o processo de ensino e aprendizagem, tanto dentro da escola quanto no ambiente familiar.

Bibliografia

CARVALHO, A.M.C. et al. (Org.). Brincadeira e cultura: viajando pelo Brasil que brinca .São Paulo: Casa do Psicólogo, 1992.

CRAIDY, Carmem Maria, org; KAERCHER, Gladis E., org. Educação infantil: pra que te quero?. Porto Alegre: Artmed, 2001.

KISHIMOTO, Tizuco Morchida. Jogo, Brinquedo, Brincadeira e a Educação. São Paulo: Cortez, 2002.

ZANLUCHI, Fernando Barroco. O brincar e o criar: as relações entre atividade lúdica, desenvolvimento da criatividade e Educação. Londrina: O autor, 2005.

*Vídeo sobre a educação na Finlândia: https://www.facebook.com/casadajoanna/videos/vb.678507628878466/1131400443589180/?type=2&theater

Raíssa Tebet Coelho Soares – Psicóloga Clínica, especialista em Neuropsicologia e Psicologia Hospitalar, com ênfase em acompanhamento Pré e Perinatal (HCFMUSP) – CRP 06/107484 

neuropsicologia, psicologia

Educação: limites, culpa e amor

Será que vou dar conta das necessidades do meu filho? Tenho que suprir todas as necessidades da criança?

Nos primeiros meses de vida, é normal e mesmo esperado que os pais se dediquem de forma quase que exclusiva ao bebê. Mas aos poucos, é importante que ele possa ir desenvolvendo sua autonomia e experimentando doses toleráveis de frustração, o que é bem diferente de abandono. Vivenciar essa separação em curtos espaços de tempo, estimulada pela mãe e, em grande parte dos casos, pelo pai, propicia uma relação de confiança com a criança que, desta forma, tem a chance de desenvolver seus recursos internos desde pequena… o que a levará a tornar-se um adulto seguro e confiante de si mesmo.

Colocar limites não significa ser duro ou inflexível, mas dizer o que a criança pode ou não fazer, colocando regras que a orientem e protejam de situações em que ela não está totalmente madura para decidir por si própria. Além disso, esse não é um dos primeiros de muitos que irão acontecer pela vida e é melhor que a criança aprenda em casa, em um ambiente seguro e amoroso, a ser capaz de tolerar a frustração.

No entanto, em alguns casos, a criança procura testar a paciência e persistência dos pais e suas regras… para chamar sua atenção. Nada a deixa mais feliz que receber atenção e afeto verdadeiros e, dessa forma, é natural que quando não estejam recebendo atenção suficiente, tenham comportamentos para chamar a atenção e manter os pais por perto. Há crianças que preferem castigos e restrições, mantendo assim, os pais ao seu lado, do que portarem-se bem e os pais estarem ausentes.

Mas dizer não, colocar limites e castigos gera culpa… e o olhar do outro dentro de nós acusa!

É importante ter a clareza que, a longo prazo, a criança que não recebeu limites dentro de casa e foi superprotegida, pode transformar-se em um jovem infantilizado, inseguro, dependente e mal educado… demonstrando uma insatisfação crônica e até mesmo exigindo que os pais realizem todos seus desejos – comportamento tirânico. Apresentam, muitas vezes, comportamentos de risco, como o uso abusivo de álcool e outras drogas, a prática de sexo desprotegido, entre outros… na procura desesperada por um limite, ainda que este seja o de seu próprio corpo.

Dizer não, colocar limites, enfrentar chantagens e birras é muito mais difícil e complexo do que realizar aquilo que a criança deseja naquele momento… no entanto, é tão importante para o seu desenvolvimento emocional saudável quanto o amor!

Raíssa Tebet Coelho Soares – Psicóloga Clínica, especialista em Neuropsicologia e Psicologia Hospitalar, com ênfase em acompanhamento Pré e Perinatal (HCFMUSP) – CRP 06/107484 

 

 

psicologia

As feridas emocionais de um nascimento prematuro

Uma decisão médica de urgência é tomada para salvar a vida da mãe e a do bebê… o parto ocorre brutalmente, sem nenhuma previsão, perturbando todos os projetos… todas as antecipações sonhadas pelos pais prevendo esse dia tão esperado que é a vinda de seu filho ao mundo. Este filho, nascido prematuramente, no pânico e no imprevisto, lhes é tirado muito precocemente. A incerteza de sua sobrevivência, sua fragilidade, causam grande angústia nos pais… e uma ferida emocional que, muitas vezes, não cicatriza.

A mãe, prematuramente mãe, acha-se impedida, vivendo aquele nascimento como um traumatismo sem nome. Essa interrupção brutal da gestação causa-lhe um sentimento de irrealidade: “Esse filho é realmente meu? Saiu de meu ventre?”. Quando visita o bebê pela primeira vez, pode parecer distante, ausente… muitas vezes queixando-se desse sentimento de irrealidade ou mesmo ainda “sentindo” o filho dentro de si.

Os últimos meses da gestação, quando a barriga está bem aparente, quando enxerga-se ali o bebê, quando a mãe o sente mexer e aprende a conhecê-lo, são momentos extremamente importantes para a construção da criança, mas também para a construção da mãe.

O parto prematuro ocorre quando a mulher mal começava a sentir os movimentos de seu bebê e a ser reconhecida enquanto mulher grávida, como uma futura mãe. Esse tempo de elaboração é indispensável, pois permite a criança constituir-se não só no útero da mãe, mas também em sua fantasia. Prepara o enxoval fabrica, para além das roupinhas da criança, seus braços, pernas e corpo na mente materna. Preparar seu quarto, seu berço, permitem-lhe começar a conceber uma representação de seu filho. Esses últimos meses deixam-lhe o tempo de imaginar, a sonhar seu filho, a conhecê-lo e a ser reconhecida como mãe pela sociedade, estatuto particular que a faz sentir-se forte e importante.

A autoimagem materna, manchada por este parto prematuro, faz com que ela sinta-se decepcionada consigo mesma, por não ter levado a gestação até o final e gerar um belo filho saudável. Como sentir-se mãe desse bebê que pouco interage, que não mama no seio, que não olha? O nascimento, então, parece anular-se… e a mãe permanece portadora do filho imaginário para tentar lutar contra a decepção e a inevitável culpa.

Se a ambivalência está presente em cada nascimento, o parto prematuro coloca em primeiro plano a sensação de ser perigosa para o próprio filho. Vida e morte encontram-se demasiadamente próximas e misturadas. O bebê prematuro não pode vir em socorro de sua mãe, deixando-a sozinha diante de sua angústia… É nesse momento que, muitas vezes, faz-se fundamental o acompanhamento psicológico materno, para prevenir episódios delirantes ou de graves estados depressivos.

Durante o tempo em que atuei como psicóloga junto a mães e bebês que passaram longo tempo em UTI neonatal, pude ver e conviver com diversas histórias, atuando para facilitar o reparo e fortalecimento desses vínculo estremecido, tão fundamental para o desenvolvimento do bebê prematuro… vínculo de amor que o estimula a manter-se vivo e a vencer os desafios que se colocaram tão cedo em sua vida. Observar a construção dessas histórias, a superação dos traumas vividos e a estruturação da dupla mãe-bebê, ensinou-me muitas lições sobre a vida (e algumas vezes, também sobre a morte…) que marcaram-me profundamente e mudaram o meu olhar sobre o início dessa jornada tão frágil e preciosa!

 

Bibliografia

Mathelin, C. (1999). O sorriso da Gioconda: clínica psicanalítica com os bebês prematuros. Rio de Janeiro: Cia. de Freud.

Raíssa Tebet Coelho Soares – Psicóloga Clínica, especialista em Neuropsicologia e Psicologia Hospitalar, com ênfase em acompanhamento Pré e Perinatal (HCFMUSP) – CRP 06/107484 

psicologia

A construção do vínculo mãe-bebê desde a gestação

Durante a gestação, muitos são os medos e anseios que passam pela cabeça da mulher: a saúde do bebê, a mudança na própria vida, da dinâmica familiar e a preparação para este novo papel psíquico materno, que passará a desempenhar. Junto com um novo bebê, nasce também uma nova mãe. E com isso, sentimentos de ansiedade podem aflorar.

A construção do vínculo com o bebê não é automática e imediata, pelo contrário, é gradativa e deve ser estabelecida, preferencialmente, desde a gestação, no ambiente intrauterino. Trata-se de um processo de comunicação tão complexo quanto sutil e que torna possível esta troca íntima e profunda.

O vínculo é de importância vital para a criança que está se formando, pois ela precisa se sentir desejada e amada para ter um desenvolvimento saudável. O amor e a rejeição repercutem sobre a criança muito precocemente mas, para que possa dar significado a estes sentimentos é preciso maturidade neurofisiológica. Até os três primeiros meses de vida intrauterina, as mensagens enviadas pela mãe são, em grande parte, incompreendidas pelo embrião, muito embora possam causar-lhe desconforto se percebidas como desagradáveis.

À medida que vai evoluindo, o feto torna-se capaz de registrar e de dar significado às emoções e sentimentos maternos. É quando começa a se formar sua personalidade, por volta do terceiro trimestre de gestação.  Para se livrar desse desconforto (ansiedade materna), ele começa a elaborar progressivamente técnicas de defesa como dar pontapés, mexer-se mais ativamente, que funcionam como uma mensagem de que está sendo perturbado. Se houver sintonia materno-fetal, a futura mamãe capta esta mensagem e começa a passar a mão delicadamente em seu ventre, o que é percebido e decodificado pelo feto como atitude de compreensão, carinho e proteção, tranquilizando-o.

Com a maturação e desenvolvimento do embrião dentro do útero materno, a experiência de desconforto transforma-se, aos poucos, em emoção e tem início a formação de ideias sobre as intenções maternas em relação a si mesmo. Se a mãe for amorosa e tiver uma relação afetiva com seu bebê, poderá contribuir para que nasça uma criança confiante e segura de si. Mães deprimidas ou com ambivalência emocional (dúvidas quanto a desejar ou não a gravidez e o bebê), acabam privando-o de seu amor e apoio, podendo favorecer futuros problemas emocionais, uma vez que sua personalidade foi estruturada num clima de medo e angústia.

Mesmo a gestante que rejeita seu filho, comunica-se com ele através do fornecimento do alimento. Entretanto, a qualidade desse vínculo é bastante diferente da mãe que o deseja. O bebê percebe as emoções negativas maternas como um ataque a si próprio.

O consumo excessivo de álcool, tabaco e medicamentos pela gestante são altamente prejudiciais ao desenvolvimento físico e psíquico do embrião, acarretando em sofrimento. No entanto, um fator importante a ser considerado é quando a gestante faz uso de medicações psicotrópicas. A supressão total pode deixá-la extremamente ansiosa, o que prejudica a criança e o vínculo estabelecido com ela. Nesse caso, o médico deve analisar a relação risco/benefício de retirar ou não a medicação.

A atividade sexual não traz qualquer malefício. Ao contrário: o orgasmo, especialmente na mulher, é altamente benéfico física e emocionalmente. O feto capta o bem-estar geral e a tranquilidade maternos e sente-se seguro e protegido.

Os acontecimentos graves e estressantes como perdas significativas ou situações de brigas conjugais ou com pessoas mais próximas, são causas de grande sofrimento fetal. Para diminuir os efeitos nocivos ao feto, a futura mamãe deve aumentar os períodos de descanso, oferecer-lhe apoio afetivo e conversar com ele, esclarecendo-o dos acontecimentos. Embora não haja compreensão das palavras, o feto capta o sentido do que lhe é dito e se tranquiliza… Assim, o vínculo mãe-bebê pode ser mantido, desenvolvido e fortalecido!

Raíssa Tebet Coelho Soares – Psicóloga Clínica, especialista em Neuropsicologia e Psicologia Hospitalar, com ênfase em acompanhamento Pré e Perinatal (HCFMUSP) – CRP 06/107484 

 

 

 

 

 

psicologia

Psicopatologia: um olhar cultural sobre a Depressão

Depressão. Doença psíquica que vem aumentando na atualidade… Silenciosa. Muitas vezes, fatal. Pode aparecer com sintomas de tristeza, desânimo profundo, cansaço excessivo, perda de sono, de prazer, de apetite, de interesse pelo mundo exterior. Da capacidade de amar.

O tema vem influenciando muito a Cultura, de modo geral. No Cinema, vários filmes trataram sobre o assunto, como é o caso de “As horas” (The hours, 2002), de Stephen Daldry, que conta histórias sobre três mulheres, passadas em épocas diferentes. A obra é um tratado sensível e complexo, onde as personagens são ricamente descritas sob a ótica da Depressão, promovendo diversos ângulos para a análise.

A primeira conta a história da escritora Virginia Woolf (Nicole Kidman), que em 1923 escrevia sua obra prima Mrs. Dalloway, enquanto enfrentava uma grave crise depressiva com ideias suicidas.

A segunda história se passa na Los Angeles de 1949, onde uma dona de casa grávida (Julianne Moore) planeja uma festa de aniversário para seu marido. Tem uma família comum: um marido trabalhador, bom companheiro e bom pai, típico sujeito da classe média americana e um filho encantador. Vive em um cenário neutro, sem conflitos. No entanto, é incapaz de pensar algo diferente da morte, o que fica evidente em seu olhar e em suas ações. Começa a ler o romance Mrs. Dalloway, identificando-se com a protagonista.

A terceira, narra um episódio na vida de uma descolada mulher nova-iorquina (Maryl Streep), que tem uma companheira compreensiva, uma filha adorável e um amigo que tem AIDS e está à beira da morte.

A Depressão sempre foi entendida como sinal de fraqueza, fracasso de vida e não como uma patologia. Isto vem mudando, bem como sua representação na Cultura. O filme mostra como a doença modifica-se, de acordo com a época… Na época em que viveu a escritora Virginia Woolf, sujeitos deprimidos ficavam em casa repousando, sendo os casos graves internados, sem muitas possibilidades de tratamento. A personagem da dona de casa sofre calada: na América pós-guerra, durante o otimismo do american way of life, não há espaço para tristeza. Ela tem tudo para ser feliz naquela sociedade, não há porque sofrer ou estar deprimida, ela não consegue entender o que ocorre consigo e nem saber que está doente. A personagem moderna, por sua contemporaneidade, pode gritar, nomear o seu sofrimento, buscar a compreensão de sua dor… e ser compreendida, uma vez que, nesse momento, a Depressão já é uma patologia disseminada e aceita.

As três mulheres mostram o histórico de uma patologia que, embora muito tempo desprezada, hoje é cada vez mais respeitada, compreendida e tratada. De acordo com a teoria psicanalítica, a Depressão representa uma posição de fuga, em que o sujeito que não quer saber daquilo que o afeta, impotente de sustentar o seu desejo. É sua resposta frente à angústia. Emerge quando o desejo se retrai e avança o gozo da pulsão de morte. Diante da falta, o sujeito depressivo sofre muito. Estando nessa posição, ele fica paralisado, sem nada querer saber sobre a vida, para não se referenciar à sua falta fundamental.

A patologia corresponderia a um luto que não se elabora, tal como denominado por Freud, luto patológico. Ao invés de investir sua libido nas coisas e em sua vida, o sujeito deprimido fecha-se em si mesmo, ficando ensimesmado. Dessa forma, a Depressão é a sua resposta, a escolha que lhe beneficia, embora lhe cause muito sofrimento, constituindo uma defesa contra a angústia presente na vida e uma satisfação dolorosa, masoquista, de evitar e esquivar-se de si e dos outros.

Nos casos em que ainda apresenta um certo grau de autonomia, é fundamental que o indivíduo busque ajuda especializada; na impossibilidade de procurar por si mesmo, a família deve acompanhá-lo. O acompanhamento médico, aliado à Psicoterapia, configura-se na melhor forma de tratamento para a Depressão, ume vez que o sujeito poderá nomear sua dor, enfrentar sua angústia e, de um modo progressivo, reinvestir sua energia em si mesmo… sustentando seu desejo!

 

Obs: se você ainda não viu, não deixe de assistir ao Filme!

Raíssa Tebet Coelho Soares – Psicóloga e Neuropsicóloga, especialista em Psicologia Hospitalar com ênfase em Psicologia Pré e Perinatal (CRP 06/107484) 

psicologia, Sem categoria

A superficialidade dos relacionamentos em tempos de Amor Líquido

Captura de Tela 2016-04-20 às 11.04.22

O sociólogo polonês Zygmunt Bauman, em sua obra Modernidade Líquida, apresenta o conceito de liquidez emprestado da física, reaplicando-o à sociologia, que designa estruturas sociais metamórficas, capazes de se alterarem e de se reorganizarem conforme o meio em que se encontram, símbolos da era pós-moderna. Esse período caracteriza-se por um mundo cada vez mais fragmentado e por um sujeito cada vez mais confuso consigo mesmo, com o espaço que ocupa e com o tempo que o rodeia.

A identidade cultural do sujeito pós-moderno, marcada por individualismo e narcisismo exacerbados, desloca-se o tempo todo, de acordo com o aparecimento de novos aspectos formais na cultura. Vive-se hoje num mundo sem referências e à deriva, o que gera uma crise de identidade. Essa nova realidade tem afetado diretamente o cotidiano das pessoas, trazendo interferências negativas, especialmente nos relacionamentos.

Bauman realiza uma reflexão sobre o mundo contemporâneo, dando origem ao conceito de Amor Líquido. Nossos relacionamentos pessoais, assim como o convívio social cotidiano, são mediados pela tecnologia. As pessoas estão, cada vez mais, trocando o conceito de relacionar-se por conectar-se, parceiros por redes. A internet, desta forma, assume a função de conectar pessoas, formar redes de relacionamentos cada vez mais flexíveis e esta modernidade líquida criou uma nova era nos relacionamentos, que estão cada vez mais fragilizados e desumanizados, uma vez que podem ser desmanchados a qualquer momento e muito facilmente.

Não sabemos mais como manter um relacionamento a longo prazo e isso não acorre apenas nas relações amorosas e vínculos familiares, mas nos relacionamentos humanos no geral, que estão sendo tratados como mercadorias. Quantidade sobrepõe-se à qualidade. Se existe algum defeito, podemos ser descartados e trocados. As relações terminam tão rápido quanto começam. As pessoas pensam acabar com um problema cortando seus vínculos, mas o que realmente fazem é criar problemas ainda maiores.

A confiança que tínhamos no Outro está próxima de seu fim. As pessoas têm medo de sofrer e pensam que, não estabelecendo relacionamentos, irão proteger-se. E desta forma, tornam-se cada vez mais solitárias e amargas…

 

É importante refletirmos sobre os tempos atuais e nos colocarmos algumas questões: Como devo me posicionar em meus relacionamentos? Tenho sido verdadeiramente Eu? Ando enxergando os desejos e necessidades daqueles com quem me relaciono? Como conviver na alteridade?

Para construir relacionamentos mais autênticos, devemos questionar (e tornarmos consCIENTES) da alienação e superficialidade em que estamos vivendo no mundo contemporâneo!

Raíssa Tebet Coelho Soares – Psicóloga e Neuropsicóloga, especialista em Psicologia Hospitalar com ênfase em Psicologia Pré e Perinatal (CRP 06/107484) 

 

Bibliografia

Bauman, Z. (2001). Modernidade líquida. trad. Plínio Dentzien. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor.

Bauman, Z. (2004). Amor líquido: sobre a fragilidade das relações humanas. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.

psicologia

Psicologia & Maternidade

Durante a gestação e pós-parto, a mulher passa por uma série de mudanças físicas, psicológicas e sociais que transformam toda a sua vida. A forma como ela enfrenta essas mudanças faz toda a diferença em sua adaptação e estabelecimento de um bom vínculo com a criança que irá nascer.

A busca de informações sobre os aspectos psicológicos da maternidade e, em alguns casos, o acompanhamento psicológico, são de fundamental importância para manter uma boa qualidade de vida.

 

Aspectos psicológicos da gestação

A mulher gestante, durante o ciclo gravídico-puerperal (época considerada de transição, devido a mudanças que a atingem nos aspectos fisiológico, psicológico e social), enfrenta uma crise caracterizada pela reativação de seus conflitos com suas figuras parentais. Ela já esteve no papel de filha e é do conjunto da constelação de sentimentos hostis e amorosos em relação aos pais, e em particular à mãe, que podemos entender o curso psicológico da gestação atual.

Os primeiros estudos sobre os aspectos psicológicos da gravidez surgem com Freud e a Psicanálise, através do reconhecimento do inconsciente e do aparelho psíquico, suas funções e seus desvios. Nesse período da vida da mulher, é comum a presença de sentimentos de angústia e conflitos ligados à sexualidade, à identidade sexual e ao narcisismo, sendo representado por um grande investimento de energia no próprio ego e utilização intensificada de recursos de pensamento, imaginação e fantasia.

A gestante experimenta uma ampla variedade de emoções, como introversão e passividade, uma vez que os conteúdos internos ganham destaque sobre o mundo externo, ambivalência afetiva, representada nas díades querer/não querer, poder/não poder, estar/não estar grávida, mudanças bruscas de humor, inquietação, irritabilidade, preocupação e depressão, que são reflexos da ansiedade que sente. Além disso, deve ajustar-se à mudança de imagem de si mesma e acatar a ideia da chegada de um novo membro que vem alterar a estrutura familiar. Esses conflitos são geralmente situacionais e transitórios, mas a ansiedade não controlada pode levar ao desajustamento emocional em relação à gravidez e à relação mãe-filho.

 

Captura de Tela 2016-03-07 às 22.18.37

 

Quando o desequilíbrio acontece…

Um dos transtornos mais comuns durante esse período é a depressão, cujas principais características são humor deprimido, instabilidade emocional, irritabilidade, lentidão para responder aos estímulos diários e ideias suicidas, influenciando negativamente a gestação.

Por ser um período de grande ansiedade, a mulher pode tornar-se mais vulnerável ao desenvolvimento de perturbações emocionais, sendo essa fase considerada a de maior incidência de transtornos psíquicos. As gestantes com episódios de depressão fora da gestação, ou que tiveram depressão pós-parto em gestações anteriores, bem como as que sofreram abuso físico, verbal ou sexual, são mais suscetíveis ao desenvolvimento desses distúrbios, tais como transtornos de ansiedade, depressão, transtorno afetivo bipolar, transtornos psicóticos, blues, depressão e psicose puerperal (pós-parto). O tratamento deve basear-se na psicoterapia aliada ao acompanhamento psiquiátrico, nos casos mais graves (vigência de ideias suicidas, sintomas psicóticos, rejeição extrema ao recém-nascido, drogadição, etc).

 

É importante reiterar o papel fundamental da família, passando a segurança de que essa mulher necessita através do apoio e da compreensão para lidar com os sentimentos negativos e com a culpa de não estar sentindo o “sentimento de completude e realização de se tornar mãe” idealizado e propagado pela sociedade. Quando nasce um bebê também nasce uma mãe, ou seja, do mesmo modo que o recém nascido leva um tempo para habituar-se a sua nova rotina essa “mãe recém nascida” precisa ser aceita e compreendida para poder adaptar-se e assumir psiquicamente esse novo lugar!

 

Captura de Tela 2016-03-07 às 22.22.38

 

Raíssa Tebet Coelho Soares – Psicóloga e Neuropsicóloga, especialista em Psicologia Hospitalar com ênfase em Psicologia Pré e Perinatal (CRP 06/107484)

 

Bibliografia

Baptista, M. N., Baptista, A. S. D., & Torres, E. C. R. (2006). Associação entre suporte social, depressão e ansiedade em gestantes. Revista de Psicologia da Vetor Editora, 7(1), 39-48.

Cury, A. F. (1997a). Depressão Puerperal. In Quayle, J., Tedesco, J. J. A., & Zugaib, M. (Org.), Obstetrícia Psicossomática (pp. 206-215). São Paulo: Editora Atheneu.

Cury, A. F. (1997b). Psicodinâmica da Gravidez. In Quayle, J., Tedesco, J. J. A., & Zugaib, M. (Org.), Obstetrícia Psicossomática (pp. 77-84). São Paulo: Editora Atheneu.

Filho, E. N. (1997). Os processos de Identificação e Introjeção na Gravidez. In Quayle, J., Tedesco, J. J. A., & Zugaib, M. (Org.), Obstetrícia Psicossomática (pp. 10-14). São Paulo: Editora Atheneu.

Ruano, R., Yoshizaki, C. T., Martinelli, S., & Pereira, P. P. (2012). Doenças Psiquiátricas. In Zugaib, M. (Org.), Obstetrícia Zugaib (2a ed.), (pp. 995-1008). Barueri, SP: Editora Manole.

Schmidt, E. B., & Argimon, I. I. L. (2009). Vinculação da gestante e apego materno fetal. Revista Paidéia, 19(43), 211-220.

Tedesco, J. J. A. (1997). Aspectos emocionais da Gravidez de Alto Risco. In Quayle, J., Tedesco, J. J. A., & Zugaib, M. (Org.), Obstetrícia Psicossomática (pp. 99-108). São Paulo: Editora Atheneu.